sexta-feira, 12 de novembro de 2010

A presença indispensável do RH nos Acordos Sindicais

Entrevista por Patrícia Bispo

O momento de realizar Acordo Sindical faz parte da rotina da empresas. Mesmo assim não deixa de ser delicado e, por vezes, tenso. Afinal, envolve diretamente os interesses patronais e dos funcionários. Mas, ao contrário do que muitos imaginam, existem fatores que colaboram para que o processo não se torne um ambiente de especulações e de estresse extremo como, por exemplo, a presença do profissional de Recursos Humanos e a total transparência em cada etapa das negociações.
Segundo Manuel Martins, diretor-executivo da Mesa RBL e que traz em seu currículo mais de 30 anos de atuação na área de RH, incluindo-se aí a experiência de ter sido vice-presidente de Recursos Humanos da AES Brasil, o Acordo Salarial normalmente é um período tenso, pois estão em jogo as expectativas de conquistas econômicas e sociais dos profissionais, em contrapartida aos interesses das organizações que incluem a preservação da gestão, os investimentos e os retornos esperados pelos acionistas.

Mas, é possível minimizar a tensão desse momento delicado? Sim, e isso ocorre quando é adotado um relacionamento que inclui confiança e transparência, ao longo do ano e não apenas às vésperas do início das negociações. Em entrevista concedida ao RH.com.br, Manuel Martins ressalta que alguns fatores podem prejudicar o processo e dentre esses, ele cita: falta de sensibilidade na formulação das reivindicações; criação de expectativas não realistas e a composição de equipes de negociação com comportamento agressivo. "É imprescindível a presença do profissional de RH no Acordo Sindical, porque ele é o especialista que convive com as lideranças sindicais, conhece o seu passado, orientação política e entende suas motivações e limitações", sintetiza. Confira essa interessante entrevista na íntegra e aproveite a leitura!

RH.com.br -
Um dos momentos mais delicados em uma organização ocorre quando chega a hora de realizar o Acordo Sindical, por pode gerar situações delicadas entre empresa, funcionários e os sindicatos. Um Acordo Sindical pode ser realizado de maneira mais "branda"?
Manuel Martins -
O processo de renovação de acordos sindicais é normalmente tenso por natureza, afinal estão em jogo, de um lado, a expectativa de conquistas econômicas e sociais por parte dos trabalhadores e, de outro, a possibilidade da empresa, ou grupo patronal, de atender as demandas, total ou parcialmente, preservando sua capacidade de gestão, investimento e retorno para os acionistas sem colocar em risco a sua participação no mercado e o relacionamento com os seus clientes. Do lado dos trabalhadores, também não se pode desprezar o componente político-sindical que acaba afetando o processo. Não raras vezes o endurecimento de uma das partes, ou mesmo de ambas, tem objetivos que transcendem a mera negociação coletiva. Não obstante, acredito sim seja possível transformar esse episódio em algo menos estressante para ambas as partes, a partir da construção de uma relação de confiança e transparência, ao longo do ano e não apenas às vésperas do início da negociação.

RH -
Em sua opinião, quais os fatores que mais atrapalham um Acordo Sindical?
Manuel Martins -
Como já mencionado, a falta da confiança entre as partes costuma ser fatal para o processo. Igualmente relevantes são:
- Falta de sensibilidade na formulação das reivindicações. É bom sonhar, mas temos que nos pautar pelo senso do razoável e não achar que é possível conquistar tudo de uma única vez, nem de outro lado, negar tudo e a qualquer título na hora de oferecer contrapropostas.
- Utilizar a negociação como mero instrumento de ação político-partidária e ambições pessoais. Nesse caso o que se busca não é o acordo e a composição entre as partes, mas aproveitar o momento e a exposição na mídia para outras finalidades estranhas ao processo.
- Criar expectativas não realistas. Tanto o sindicato dos trabalhadores como o das empresas pode complicar um processo aparentemente simples ao estabelecer objetivos irreais e inatingíveis.
- Compor equipes de negociação com comportamento agressivo. Em ambos os casos a falta de interesse em se colocar no lugar do outro será meio caminho andado para o fracasso.
- Falta de noção de oportunidade. Saber o momento certo de "endurecer o jogo", mas também saber o momento de ser flexível e buscar a composição.

- Falta de disposição para o "ganha-ganha". As partes condicionarem as suas conquistas à sucumbência do oponente.

RH -
Hoje, quais os recursos que mais auxiliam a elaboração e a negociação dos acordos coletivos?
Manuel Martins -
A preparação é fundamental tanto para empresas quanto para sindicatos. Há inclusive programas de treinamento específicos para isso, o famoso Role Play em que os negociadores simulam uma negociação com todos os seus elementos. Reunir informações sobre o segmento, a empresa, o cenário e as perspectivas políticas, sindicais e econômicas também ajuda. Conhecer bem o perfil dos negociadores da outra bancada é muito útil na hora de definir a estratégia e a tática a serem utilizadas.

RH -
Qual a importância do profissional de Recursos Humanos no Acordo Sindical?
Manuel Martins -
O profissional de Recursos Humanos é o especialista que convive diariamente com os dirigentes sindicais e deve liderar a bancada da empresa, até para preservar as figuras do presidente ou do diretor de Operações.

RH -
A presença da área de Recursos Humanos junto aos representantes sindicais torna-se imprescindível nesse momento?
Manuel Martins -
É imprescindível, porque, conforme como mencionei, ele é o especialista que convive com as lideranças sindicais, conhece o seu passado, orientação política e entende suas motivações e limitações. Ninguém pode substituir o profissional de RH neste mister.

RH -
A relação do RH com o sindicato logicamente difere da mantida com os funcionários que atuam na organização. Diante disso, que postura a área de Recursos Humanos precisa adotar em relação aos colaboradores?
Manuel Martins -
A negociação com o sindicato é episódico, mas a convivência com os colaboradores ocorre todos os dias. Nenhum empregado espera receber informação de todos os detalhes do que acontece na negociação, mas quer ter certeza que será informado do que for relevante para ele. Objetividade e tempestividade são importantes nessa hora.

RH -
Como o RH pode evitar que os boatos da rádio peão comprometam o andamento das negociações junto ao sindicato?
Manuel Martins -
A palavra chave é transparência. O profissional de RH deve comunicar exaustivamente as posições da empresa, relatar o resultado das reuniões na medida em que transcorre, esclarecer pontos dúbios e orientar a supervisão para atuar muito próxima das equipes no "chão de fábrica". A confiança construída ao longo do tempo revela-se um trunfo poderoso nessa hora.

RH -
Durante o momento do Acordo Sindical é aconselhável avaliar o clima interno na empresa?
Manuel Martins -
Sempre. Esse é um excelente termômetro para saber como andam as coisas e qual a disposição, o sentimento e as expectativas do público interno, mas é importante não cair na tentação de querer fazer num dia o que não foi feito ao longo do ano.

RH -
De que forma efetiva, o RH pode trabalhar aspectos comportamentais dos colaboradores que se sobressaem durante o período de Acordo Sindical?
Manuel Martins -
Pessoas que se sobressaem positivamente nesses períodos revelam sua identificação com a empresa e, eventualmente, podem qualificar-se para o desenvolvimento de carreira e liderança.

RH -
Quais os cuidados que a empresa deve adotar na primeira proposta de Acordo Coletivo?
Manuel Martins -
É preciso avaliar o ponto de maturidade do processo a cada etapa e programar as reuniões e propostas à medida que o processo evolui. Antecipar "posições finais" pode ser precipitado e gerar expectativas de que a empresa na verdade dispõe de muito mais para oferecer e, portanto, não é hora de aceitar propostas aparentemente preliminares.

RH -
O que nunca deve ser efetivado em um Acordo Sindical, no que se refere à direção e à área de Recursos Humanos de uma empresa?
Manuel Martins - Confundir os papéis de direção e de RH, enviar mensagens contraditórias com o uso de mais de um porta-voz pela empresa, desautorizar a equipe que está negociando pela empresa, prometer o que não puder ser cumprido e ceder o que não pode apenas para se livrar da pressão do sindicato ou da ameaça de greve. Sob nenhuma hipótese a direção pode comportar-se como uma via paralela que fala com o sindicato sem a participação ou o conhecimento de RH.

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